Do espectro que abrange os crimes sexuais, enfoco o estupro e o atentado violento ao pudor pelas suas repercussões na vítima e gravidade de violência.
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O Estupro está tipificado no artigo 213 da parte especial do Código Penal:
“Constranger mulher ã conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça”.
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E o Atentado Violento ao Pudor tipificado no artigo 214 da mesma parte especial do Código Penal:
“Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal”.
- Ambos os crimes sob o ponto de vista médico-legal apresentam sinais de materialidade que basicamente se dividem em três grupos:
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Ruptura himenial – que pode ser recente (aonde irão se evidenciar sinais de solução de continuidade [pequenos sangramentos com escoriações] ) ou tardio (região himenial completamente cicatrizada);
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Espermatozóides – que no meio vaginal, via de regra, sobrevivem até cerca de 48 horas;
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Gravidez – o mais patente dos sinais de que houve relação sexual.
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Mas à medida que cresce a tecnologia pericial na detecção das provas – os criminosos premeditados (regra) ficam mais arrojados nestes crimes sexuais.
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O exame de corpo de delito que tenderia a evidenciar os sinais de materialidade do ato sexual muitas vezes hoje não o faz, já que em muitos casos, o criminoso utiliza o preservativo.
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A grave ameaça “com o revolver apontado para a cabeça da vitima” passa na prática a ser a regra e assim a violência passa de física a ser moral diminuindo a especificidade do exame de corpo de delito.
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Ainda o Subrregistro destes crimes infelizmente é a regra, principalmente na periferia das grandes cidades, devido: a vergonha, a impunidade, o medo do criminoso, o medo do preconceito, o medo do julgamento social - de que pelo seu comportamento instigou o criminoso a praticar tal bárbaro ato.
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Qualquer mulher pode ser vitima de estupro: as prostitutas e as casadas – “quando há violência não se pode falar em exercício regular de direito” (Damásio de Jesus) associam-se a esta idéia (Mirabete e Celso Delmanto).
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Nos crimes sexuais a regra, principalmente no que se refere à violência contra o menor, mostra que o criminoso é do meio intrafamiliar.
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O que se preconiza no Atendimento a Vítima:
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Anamnese completa – com ênfase no tipo de violência sexual (para avaliar risco de transmissibilidade de infecções) e no método anticoncepcional e na fase do ciclo menstrual (avaliar risco de gestação).
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Exame físico completo e tratamento das lesões que o exigirem – a necessidade de detalhada descrição das lesões (inclusive com estimativa temporal) para subsidiar o inquérito policial.
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Coleta de exames: BHCG; VDRL; Anti-HIV: Hepatite B e C e coleta de secreção vaginal e retal.
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BHCG; VDRL; Anti-HIV: Hepatite B e C – devem ser coletados mesmo que o ato tenha ocorrido há menos de 24 horas, obviamente, que o objetivo passa a ser se a vítima já tinha antes da violência tais patologias ou estava grávida.
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Coleta de secreção vaginal e retal – procurando identificar espermatozóides ou infecção vaginal ou retal advinda do ato sexual.
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Profilaxias:
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Da gravidez indesejada: Método Yuzpe =
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Etinilestradiol 0,03 mg + Levonorgestrel 0,15 (Microvlar) 4 cp VO de 12/12 horas 2 doses
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Etinilestradiol 0,05 mg + Levonorgestrel 0,25 Neovlar 2 cp de 12/12 horas 2 doses
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Microvlar 1 cp VO 8/8 horas 5 dias.
Pílula do dia seguinte Levonorgestrel 0,75 (Postinor) 1 cp VO 12/12 horas 2 doses.
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Ambos só tem grande eficácia nas primeiras 24 horas atingindo cerca de 95% de não gestação. Não adianta tentar utiliza-lo quando já e evidencia atraso menstrual.
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Mesmo que o estuprador não ejacule pode ocorrer fecundação pois o liquido que lubrifica o canal uretral masculino, antes da ejaculação, contém espermatozóides. Também em virtude disto é que sempre dissemos que o coito interrompido não é um bom método anticoncepcional.
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O principal mecanismo de ação, ainda é impedir a fecundação num primeiro momento, mas também atua impedindo a nidação.
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Se houver falha da anticoncepção de emergência e a paciente engravidar, se for seu desejo, o abortamento é previsto na lei e deveria ser feito pelo SUS.
“Artigo 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:
II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal”
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Aqui há uma delicada questão que devemos mencionar:
O aborto sobre o prisma legal é a interrupção da gestação antes do nascimento, independentemente da idade gestacional; sob o ponto de vista médico obstétrico, é a interrupção da gravidez até a vigésima semanas. Esta fixação temporal tem uma grande importância na análise de alguns casos concretos:
Na gravidez de uma menina de 13 anos, menor de 14, a violência é presumida, mesmo que ela consinta no ato sexual, portanto se há relação pênis vagina no caso aludido - há estupro e o aborto segundo o artigo 128 pode ser executado (independentemente da idade gestacional). Obviamente que se a gravidez apresenta adiantado desenvolvimento não se executa o ato por motivos éticos, mas o princípio legal autoriza.
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Como é realizada a interrupção da gestação:
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Até as 12 semanas – curetagem uterina
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De 13 a 20 semanas – indução com misoprostol + ocitosina; após a eliminação do feto Curetagem Uterina.
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Gestação > 20 semanas – não se recomenda interrupção – oferecer acompanhamento pré-natal e psicológico, procurando facilitar os mecanismos de adoção se a paciente desejar.
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Das DSTs - as infecções mais freqüentes são: gonorréia, clamídia, vaginose bacteriana, tricomoníase e as infecções virais pelo herpes e pelo papilomavírus humano.
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Do HIV – a taxa de infecção para mulher:
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Relação heterossexual vaginal única 0,08 a 0,2 %
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Relação heterossexual anal única 0,1 a 0,3 %
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Relação heterossexual dupla + violência física 0,8 a 1,6 %
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Violência com múltiplos agressores chega a 10%
Não existem dados precisos que possam estabelecer a eficácia da administração profilática de anti-retrovirais nos casos de violência sexual, mas o uso destas drogas tem sido recomendado com objetivos profiláticos em outras formas de exposição como acidentes ocupacionais:
A recomendação do CDC e do Ministério da Saúde é:
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AZT 300 mg VO 12/12 horas 4 semanas + Lamivudina (3TC) 150 mg VO 12/12 horas 4 semanas.
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Da hepatite B – anticorpo – Imunoglobulina hiperimune para hepatite B dose única seguida da Vacina para hepatite B - primeira dose nas primeiras 72 horas (outras duas em 30 e 180 dias).
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Acompanhamento:
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Sífilis em 30 dias;
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Anti HIV em 90 e 180 dias;
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Hepatite B em 60 e 180 dias;
“PROCURAR ATENDIMENTO ESPECIALIZADO LOGO APÓS A VIOLÊNCIA SEXUAL, MESMO COM A DOR INERENTE AO ATO, É A MELHOR E A ÚNICA FORMA DE EVITAR UM MAL MAIOR.”
Bibliografia
Código Penal art. 213; 214 e 218.
Medicina Legal Genival França Guanabara Koogan
Rotinas em Ginecologia Freitas e Col. Artes Médicas
Rotinas em Obstetrícia Freitas e Col. Artes Médicas
Citações de Damásio de Jesus, Mirabete e Celso Delmanto